segunda-feira, 27 de junho de 2011

Possibilidades para pensar a instalação

por Francieli Garlet

No encontro desta semana reunimo-nos para discutir uma parte da tese de doutorado de Ana Maria Albani de Carvalho, intitulada A instalação como problemática artística contemporânea: os modos de espacialização e a especificidade do sítio.
A primeira parte do primeiro capítulo - A instalação como problemática artística contemporânea: contexto e complexidade – nos apresenta indagações sobre as possibilidades e limites para o estabelecimento da definição de instalação, bem como um sobrevôo sobre alguns conceitos, como o de contexto, o de objeto contextual, o de problemática e o de complexidade.

A noção de CONTEXTO trazida pelo texto abriga dois fatores: o espaço físico e geográfico; e a noosfera - o universo das representações e símbolos;
Tomando emprestado o conceito de contexto trabalhado por Ângela Blanco, numa abordagem museológica e museográfica, Carvalho o define “como uma rede de ‘associações contextuais significativas’, como um cruzamento entre aspectos de ordem ‘espacial, temporal e funcional’.” (CARVALHO, 2005, p. 45-46)

A autora considera a instalação possuidora de um caráter notavelmente contextual, entendendo o contexto como algo que não funciona unicamente como pano de fundo nem somente como uma chave que conduz à elucidação da obra.

O OBJETO CONTEXTUAL é a relação que a instalação estabelece com o recinto de exposição, em contraponto ao objeto artístico concebido como autônomo em relação ao lugar no qual vai a público e indiferente às possíveis condutas do espectador.

A noção de PROBLEMÁTICA parte da criação de interrogações, que não tenham uma resposta imediata, simples ou definitiva. Sendo assim, um problema não é algo dado, mas sim resultado de um determinado modo de pensar, analisar e argumentar em torno de um determinado tema (CARVALHO, 2005). Uma descrição possível entre outras.

Na noção de COMPLEXIDADE Carvalho faz algumas distinções entre o complexo e o complicado. Com ajuda de Almeida a autora define complicado como algo que pode ser decomposto em partes, quantas forem necessárias para permitir sua compreensão (Método cartesiano: dividir para explicar melhor). Já o complexo é abordado como algo tecido de elementos heterogêneos inseparavelmente associados, apresentando a relação paradoxal entre o uno e o múltiplo.

Alguns elementos associados à noção de complexidade:
A imprevisibilidade (que se dá no processo que vai do projeto à instalação em si)



De que samba você bebe? (2011)
Em função do vento que havia no local, precisamos colocar a xícara gigante num outro espaço entre árvores. A intervenção que tinha como objetivo inicial a participação (retorno) do público, teve apenas o retorno de uma pessoa, impedindo assim a produção da segunda etapa programada inicialmente.



O inacabamento (a mesma instalação pode ser montada em lugares distintos, o que sugere novos diálogos).



Liberdade condicionada I (2009), durante feira de artes e artesanato, em frente ao MASM, e Liberdade condicionada II (2009), durante o II CEAC, Congresso de Educação, Arte e Cultura, locais e públicos diferentes.


Outra questão apontada pela autora acerca da instalação diz respeito às formas de sua documentação. A fotografia já não dá conta “sozinha” de abarcar as sensações que não são visíveis.


Café com Monstros (2010)
A instalação contava com o som de pingos caindo num recipiente, que provocava o imaginário a percorrer uma atmosfera de umidade, o cheiro dos materiais empregados, o café que era oferecido ao público, sensações que não são capturadas pela câmera fotográfica.

 

A partir dos pontos abordados nesta parte da tese de Carvalho nos aproximamos de alguns conceitos pertinentes para pensar a instalação e os trabalhos realizados no coletivo (des)esperar.

CARVALHO, Ana Maria Albani de. A instalação como problemática artística contemporânea: os modos de espacialização e a especificidade do sítio. Tese (Doutorado em Artes Visuais) Instituto de Artes da UFRGS, Porto Alegre, 2005.







sexta-feira, 17 de junho de 2011

Depois da chuva

           

    
“Gosto muito de apanhar do chão castanhas, velhos farrapos, sobretudo papéis. Sinto prazer em pegá-los, fechá-los em minhas mãos; por pouco não os levo à boca, como as crianças fazem. (...) Durante o verão ou no início do outono encontram-se nos jardins pedaços de jornais crestados pelo sol, ressecados e quebradiços como folhas mortas, tão amarelos que se poderia imaginar que tivessem sido mergulhados em ácido pícrico. No inverno outras folhas de papel mostram-se pisadas, maceradas, maculadas: retornam à terra. Outras ainda, muito novas e até brilhantes, muito brancas, palpitantes, estão pousadas como cisnes, mas por baixo a terra já as agarra. Torcem-se, arrancam-se da lama, mas só para cair um pouco mais adiante, definitivamente. Tudo isso é bom de pegar. Às vezes simplesmente as apalpo olhando-as bem de perto; outras vezes rasgo-as para ouvir sua longa crepitação, ou então, se estão muito úmidas, ateio-lhes fogo, o que não é fácil; depois limpo as palmas das mãos cheias de lama numa parede ou num tronco de árvore.” (A Náusea – Jean-Paul Sartre)
Desenhar, recortar, colar, inventar, distribuir, pegar, perguntar, rasgar, jogar fora, guardar... não se trata apenas de papel, mas de estar vivo e vivendo...