sexta-feira, 17 de junho de 2011

Depois da chuva

           

    
“Gosto muito de apanhar do chão castanhas, velhos farrapos, sobretudo papéis. Sinto prazer em pegá-los, fechá-los em minhas mãos; por pouco não os levo à boca, como as crianças fazem. (...) Durante o verão ou no início do outono encontram-se nos jardins pedaços de jornais crestados pelo sol, ressecados e quebradiços como folhas mortas, tão amarelos que se poderia imaginar que tivessem sido mergulhados em ácido pícrico. No inverno outras folhas de papel mostram-se pisadas, maceradas, maculadas: retornam à terra. Outras ainda, muito novas e até brilhantes, muito brancas, palpitantes, estão pousadas como cisnes, mas por baixo a terra já as agarra. Torcem-se, arrancam-se da lama, mas só para cair um pouco mais adiante, definitivamente. Tudo isso é bom de pegar. Às vezes simplesmente as apalpo olhando-as bem de perto; outras vezes rasgo-as para ouvir sua longa crepitação, ou então, se estão muito úmidas, ateio-lhes fogo, o que não é fácil; depois limpo as palmas das mãos cheias de lama numa parede ou num tronco de árvore.” (A Náusea – Jean-Paul Sartre)
Desenhar, recortar, colar, inventar, distribuir, pegar, perguntar, rasgar, jogar fora, guardar... não se trata apenas de papel, mas de estar vivo e vivendo...
          

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